Olhando Para O Céu

Vamos imaginar que, olhando para o céu, vemos uma linda nuvem. E pensamos: “Ah, que nuvem linda!”. Pouco mais tarde, voltamos a olhar para o céu, que está limpo e azul, e pensamos: “Ah, aquela nuvem desapareceu”. Em dado momento, as coisas parecem existir, mas depois elas se vão. E nós observamos tudo dessa maneira, pois tendemos a estar presos a sinais, aparências e formas familiares, e isso nos impede de enxergar a verdadeira natureza da realidade.

Quando vemos algo que reconhecemos neste mundo, como uma nuvem, dizemos que ela está presente, que existe. E quando a deixamos de ver, dizemos que não está mais lá, que deixou de existir. Mas a verdade subliminar é que essa coisa continua existindo, ainda que sua aparência tenha sido alterada. O desafio é reconhecer essa coisa em suas novas formas. Essa é a meditação da ausência de imagem.

Para compreendermos a verdadeira natureza do nascimento e da morte, e superarmos o medo, a mágoa, a raiva e o pesar, precisamos enxergar as coisas com um olhar ausente de imagens. Se soubermos ver com um olhar ausente de imagens, não será complicado responder à pergunta sobre o que acontece quando morremos.

Uma imagem é o que caracteriza a aparência de algo, suas formas. Se reconhecemos as coisas baseados nas imagens, podemos pensar que esta nuvem é diferente daquela, que este carvalho não é uma nogueira, que uma criança não é o seu pai. Em um nível de verdade relativa, tais distinções são úteis. Mas elas podem nos impedir de enxergar a real natureza da vida, que transcende tais imagens. Segundo Buda: “Onde existe imagem sempre existe engano”. Com o insight do entre-ser, podemos enxergar a existência de uma profunda conexão entre esta e aquela nuvem, entre um carvalho e uma nogueira, entre um pai e um filho.

A nuvem que estava no céu pode parecer ter desaparecido. Porém, se olharmos bem, veremos que os mesmos elementos que formavam a nuvem agora são chuva, névoa ou neve. A verdadeira natureza da nuvem, o H2O2, continua presente, existindo de maneira diferente. É impossível que o H2O2 deixe de ser algo para se transformar em nada, passe de ser a não ser. Embora não possamos mais vê-la, a nuvem não morreu. Talvez tenha se transformado em chuva, que mais tarde será a água que chegará a uma torneira, depois à minha chaleira, e encherá minha xícara de chá. A nuvem que ontem estava no céu não desapareceu, tornou-se chá. Ela não morreu, está apenas brincando de pique-esconde!

Você também vive se transformando. Passe as páginas de um álbum de família e veja uma foto sua quando criança. Onde está essa criança agora? Você sabe que ela é você. Vocês têm o mesmo nome, mas ainda assim essa criança não se parece contigo. Você continua sendo essa criança ou se tornou outra pessoa? Essa é uma prática de contemplação da sua própria ausência de imagem. Hoje você parece, fala, age e pensa diferente. Suas formas, sentimentos, percepções e consciência são muito diferentes. Você não é uma coisa fixa e permanente. Portanto, você não é a mesma pessoa, mas também não é uma pessoa completamente diferente. Quando você deixa de estar preso a imagens e aparências específicas, pode enxergar as coisas com maior clareza. Pode ver que aquela criança continua viva em todas as células do seu corpo. Em qualquer momento é possível escutar e cuidar daquele menino ou menina que existe em você. É possível fazer um convite para que aquela criança respire com você, caminhe com você e desfrute da natureza com você.